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Redução de danos não é apologia às drogas, é cuidado humano

Redução de danos não é apologia às drogas, é cuidado humano

A Gestos – Soropositividade, Comunicação e Gênero vem, por meio desta nota, repudiar a ação arbitrária da Polícia Civil de Pernambuco e da Guarda Municipal de Olinda que, na segunda-feira (20), realizou uma ação para fechar a Casa de Redução de Danos durante o carnaval da cidade. Lamentamos profundamente o despreparo de ambas as corporações, que entendem a política de drogas única e exclusivamente sob o viés da truculência e da criminalização de sujeitos.

A Redução de Danos (RD) é um conjunto de estratégias e práticas individuais e coletivas, adotadas com o objetivo de reduzir os efeitos nocivos associados ao consumo de psicoativos (lícitos e/ou ilícitos) para pessoas que não querem, ou mesmo não podem interromper o uso. As intervenções são baseadas no compromisso com a autonomia, a saúde pública e os direitos humanos e se contrapõem às políticas e práticas punitivistas.

Ao longo das últimas décadas, inúmeras pesquisas no campo das ciências humanas e da saúde, promovidas por diversas universidades e centros de estudos nacionais e internacionais, têm indicado que a criminalização e a marginalização de pessoas que fazem uso de drogas contribui apenas para o aumento da violência e da mortalidade, bem como para o aprofundamento das desigualdades sociais. 

A Casa de Redução de Danos, montada na Rua 13 de Maio, é fruto de uma iniciativa pioneira promovida pela ONG Escola Livre de Redução de Danos. Ali acontecia a ação social “Fique suave no carnaval”, que buscou distribuir preservativos e itens adequados para a utilização de entorpecentes, inclusive de bebidas alcoólicas (uma das drogas que mais mata no mundo, mas paradoxalmente patrocina anualmente as festividades).

Além da distribuição de insumos, a casa informava sobre os efeitos de várias substâncias recreativas e também permitia aos foliões e às foliãs: se alimentar, descansar em local adequado, hidratar-se, ter acesso a protetor solar e até absorventes (para as pessoas com útero). Contudo, o espaço foi alvo de denúncias reacionárias junto à Guarda Municipal de Olinda e à Polícia Civil que, mesmo após a constatação (por ambas as corporações) de que nenhuma substância ilícita estava sendo distribuída, apreendeu materiais e conduziu a coordenadora da ONG, a ativista Ingrid Farias, à delegacia para prestar esclarecimentos.

É lamentável que o Estado criminalize dessa forma ações da sociedade civil organizada que deveriam ser realizadas justamente pelo próprio Estado, que ao invés de financiar ações de RD como política pública, prefere investir nas comunidades terapêuticas ligadas aos setores ultra conservadores e fundamentalistas da política pernambucana, que violam direitos humanos com financiamento público; setores esses que agora acusam a Escola Livre de Redução de Danos de fazer “apologia” através da distribuição de um suposto “Kit Droga”, composto, na realidade, por itens de autocuidado e prevenção às infecções sanguíneas e/ou sexualmente transmissíveis.

É um fato que a celebração do carnaval está associada ao uso de entorpecentes (de qualquer natureza) desde a sua criação. Acreditar que o consumo de substâncias durante este período será combatido através da perseguição de iniciativas que promovem o cuidado humano e a valorização da vida é um reflexo da falta de alinhamento da política de drogas em Pernambuco com o que indicam evidências científicas e as práticas internacionais que têm se mostrado mais eficientes. 

A Casa de Redução de Danos foi fechada pelas corporações acima citadas e nenhuma droga a menos foi consumida durante o Carnaval de Olinda, porém milhares de pessoas deixaram de fazer um uso mais seguro, higiênico e consciente justamente por causa da ação dessas mesmas corporações. 

Nos solidarizamos sinceramente com a Escola Livre de Redução de Danos e entendemos também que este não é um ataque exclusivo à instituição, mas às próprias políticas de RD, bem como uma forma de criminalização das organizações da sociedade civil que atuam na promoção do direito à saúde e dignidade humana. É urgente que o Estado reconheça que qualquer política de drogas que não seja baseada em direitos e fundamentada nos princípios do cuidado humano está fadada ao fracasso!

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