Recife Aprova Lei Roberta Nascimento: Um Passo Contra o Transfeminicídio
A Câmara Municipal do Recife, em sua sessão realizada em 9 de outubro, aprovou o Projeto de Lei Roberta Nascimento, apresentado pela vereadora Liana Cirne (PT) e que estabelece o 24 de junho como o Dia Municipal de Enfrentamento ao Transfeminicídio no Recife. Este projeto de lei foi elaborado como resposta ao trágico assassinato de Roberta Nascimento em 2021 e foi desenvolvido com diversas organizações da sociedade civil, incluindo o Movimento Independente de Transmasculinidades, a ANTRA, Amotrans e a NATRAPE.
Aprovada na Câmara Municipal, esta proposta agora aguarda a aprovação do Prefeito João Campos. É importante notar que, embora tenha obtido 16 votos favoráveis, seis votos contrários e uma abstenção, 12 vereadores/as presentes na sessão online se mantiveram em silêncio, evidenciando um preocupante desinteresse por parte de uma parte significativa do legislativo municipal em relação à vida das mulheres trans e travestis.
Esta é a primeira lei na cidade do Recife a ser nomeada em homenagem a uma mulher trans. No entanto, as circunstâncias que motivaram essa homenagem são extremamente brutais e levantam questões fundamentais sobre o lugar que a sociedade atribui às mulheres trans e travestis.
Roberta Nascimento, cuja vida foi ceifada aos 33 anos, sofreu uma violência terrível em 24 de junho de 2021, quando seu corpo foi incendiado por um adolescente no Cais de Santa Rita. Ela sucumbiu a essas feridas 15 dias depois, após enfrentar queimaduras em 40% do corpo e ter seus dois braços amputados devido à gravidade dos ferimentos. Nesse mesmo mês, outras quatro travestis (Kalyndra, 26 anos; Pérola, 37; Fabiana, 30) também foram vítimas desse tipo de violência, evidenciando a urgência de combater a transfobia.
É alarmante que o Brasil seja líder mundial em assassinatos de pessoas LGBTQIAPN+ – algo que a Gestos vem denunciando internacionalmente desde 2017, através do Relatorio Luz da Sociedade Civil sobre a Agenda 2030, publicado anualmente pelo Grupo de Trabalho da Sociedade Civil para a Agenda 2030 (GT Agenda 2030). As mulheres trans e travestis são as mais vulnerabilizadas à violência no país, com uma expectativa de vida reduzida a apenas 35 anos.
De acordo com o dossiê “Assassinatos e violências contra pessoas Trans” da Associação Nacional de Travesti e Transexuais (Antra), Pernambuco liderou o número de assassinatos violentos de pessoas trans no último ano, com 59 casos de transfemicídio identificados entre 2017 e 2022.
Ainda, o levantamento “Travestis Também Envelhecem“, produzido pela ONG Gestos e apresentado na Câmara dos Vereadores em abril deste ano, revelou que 69% das mulheres trans e travestis em processo de envelhecimento na cidade do Recife não imaginavam atingir a terceira idade, com a violência contra as travestis sendo a razão mais frequente.
A Gestos parabeniza a Câmara Municipal do Recife a pela aprovação do projeto da Lei Roberta Nascimento, enquanto repudia a persistência do sentimento transfóbico nas casas legislativas municipais, estaduais e federal. Acreditamos que a valorização e proteção da integridade e dignidade humana são responsabilidades do Estado e que medidas efetivas de combate aos crimes de ódio são necessárias para evitar tragédias como as de Roberta, Kalyndra, Pérola, Fabiana e tantas outras.
No entanto, é vital destacar que a inclusão de uma nova data no calendário municipal, embora seja um passo positivo, não é suficiente para combater eficazmente os crimes de ódio. Esperamos que o Prefeito João Campos (PSB) aprove rapidamente esta lei e que, junto com ela, proponha mais ações, respaldadas por um orçamento público sólido, equipamentos públicos de alta qualidade e acesso universal, para que as pessoas trans de nossa cidade sejam tratadas como merecem: com respeito, dignidade e cidadania.
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