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Nota de repúdio à decisão do STF

Gestos – Soropositividade, Comunicação e Gênero, organização não governamental que desde 1993 atua na defesa dos Direitos Humanos das pessoas que vivem com HIV/AIDS, vem repudiar a suspensão pelo STF de decisão que impedia a União de incluir, no edital de concurso para as Forças Armadas, exigências relacionadas à altura de candidatos restrições a portadores do vírus HIV e outras doenças infecciosas incuráveis. O presidente do STF, ministro Ricardo Lewandowski, acolheu o pedido da AGU para suspender a decisão por entender que as limitações previstas nas regras de seleção atende a peculiaridades do regime militar.

A atuação da AGU ocorreu em recurso contra sentença do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) no qual aquele órgão explicou que há diversos precedentes judiciais reconhecendo como válidas restrições relativas a patologias ou o uso de medicações que gerem imunodepressão ou a presença de qualquer doença sexualmente transmissível, assim como a validade dos testes de detecção do vírus HIV. Segundo os advogados públicos, a requisição do teste anti-HIV nos processos seletivos para ingresso nos quadros das Forças Armadas atende às peculiaridades do regime militar e se justifica pela necessidade de preservar a higidez física do portador do vírus e dos demais militares, afirmações que desprezam os fundamentos científicos, o progresso no combate ao vírus e o direito humano ao trabalho da comunidade soropositiva.

A solicitação do teste anti-HIV por parte das forças armadas é completamente discriminatório, violadora do direito humano à intimidade, ao trabalho e à dignidade da pessoa humana, e fere vários preceitos legais internacionais e nacionais como o art. 12 da Declaração Universal de Direitos Humanos; o art. 11 da Convenção Interamericana dos Direitos do Homem de 1969; a Convenção 111 da Organização Internacional do Trabalho – OIT, a Recomendação nº 200 da OIT, artigos 24, 25 e 26; o art. XII; Art. 3ª, inciso IV da Constituição Federal; o art. 5º, caput da Constituição Federal; o artigo 5º, inciso X da Constituição Federal; o art. 2º da Portaria nº 1.246/2010 do Ministério do Trabalho e Emprego; o art. 2º, inciso I da lei 9.029/95; a Portaria Interministerial nº 869, de 11 de agosto de 1992, a qual veda expressamente a exigência de testes para admissão em cargos de âmbito do Serviço Público Federal, em que o objetivo seja a detecção da presença do vírus HIV; a Resolução nº 1665/2003 e o Parecer 01/2013 do CFM.

Ademais, o Ministério da Saúde, na Nota técnica 158/2013, também entende que é ilícita a testagem compulsória:

Parte final da nota técnica 158/2013
“(…) as demais doenças sexualmente transmissíveis que não diminuem a aptidão para exercer plenamente a atividade laborativa, dispõem do mesmo embasamento técnico.
Ante o exposto, e:
a) Considerando que ordenamento jurídico brasileiro não permite discriminação arbitrária em detrimento da dignidade da pessoa humana e dos demais princípios republicanos;
b) Considerando a flagrante violação aos preceitos de testagem no que diz respeito à voluntariedade, confidencialidade e sigilo: e,
c) Considerando que a condição sorológica não revela, por si só, a incapacidade laborativa.
Este Departamento de DST, Aids, Hepatites Virais, da Secretaria de Vigilância em Saúde, do Ministério da Saúde, se manifesta contrário à exigência de testagem compulsória para HIV, DST e Hepatites Virais e, via de consequência, de exclusão das pessoas portadoras desses agravos”.

Para além, existe decisão recente também de tribunal superior (STJ) que vai de encontro a esta decisão do STF, abaixo colacionada:

RECURSO ESPECIAL Nº 1.401.131-PE (2013/0290772-1) RELATORA: MINISTRA ASSUSETE MAGALHÃES RECORRENTE: UNIÃO RECORRIDO: G R DOS S ADVOGADO: KARIANA GUÉRIOS DE LIMA E OUTRO(S) DECISÃO Trata-se de Recurso Especial interposto pela União, com fundamento na alínea a do permissivo constitucional em face de acórdão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, assim ementado: “CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. MILITAR. CONCURSO. CANDIDATO PORTADOR ASSINTOMÁTICO DO VÍRUS HIV. EXCLUSÃO. EXIGÊNCIA DO TESTE. IMPOSSIBILIDADE. DISCRIMINAÇÃO. VEDAÇÃO CONSTITUCIONAL. CAPACIDADE LABORATIVA PRESERVADA. PERÍCIA MÉDICA JUDICIAL. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. OCORRÊNCIA. PRELIMINAR DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO REJEITADA. IMPROVIMENTO DA APELAÇÃO. (STJ, Ag Rg no AREsp 145.316/ BA, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, DJe de 09/04/2013). Ante o exposto, nos termos do art. 557, do Código de Processo Civil, nego seguimento ao Recurso Especial. I. Brasília (DF), 15 de maio de 2015. MINISTRA ASSUSETE MAGALHÃES Relatora (7240) (grifos nossos).

Diante do exposto, é evidente que este julgado do STF trará grande prejuízo a todas as pessoas que vivem com HIV e AIDS no Brasil, sendo um grande retrocesso para garantia dos direitos à intimidade, dignidade e ao trabalho que vêm sendo arduamente conquistados pela comunidade HIV+ e, por decorrência, aos direitos e liberdades fundamentais dos(as) cidadãos(ãs) brasileiros(as).

Recife, 08 de junho de 2015

Temas deste texto: AIDS - HIV - Ministério da saúde - STF - TRF

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