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Jair Brandão: duas décadas de engajamento na resposta ao HIV no Brasil

Jair Brandão: duas décadas de engajamento na resposta ao HIV no Brasil

Sete anos depois de descobrir que vivia com HIV, Jair Brandão aguardava uma consulta médica numa clínica no Recife, no Nordeste do Brasil, quando um colega paciente lhe informou que poderia acessar apoio psicossocial numa organização não-governamental próxima. Embora tenha levado muitos anos para aceitar sua condição de HIV+, ele precisou de apenas três sessões de aconselhamento para perceber que deveria se tornar um ativista do HIV.

“Fiquei emocionado e assustado ao mesmo tempo, porque não entendia muito sobre espaços políticos, nem sobre AIDS e políticas de saúde. Não sabia como me envolver em discussões políticas”, lembra Brandão, que duas décadas depois é um dos mais influentes ativistas do HIV no Brasil. “Primeiro, tive que me aceitar como pessoa vivendo com HIV, e esse foi um dos desafios. E então aprendi sobre o vírus e me cuidei. Somente depois comecei a aprender sobre questões sociais e políticas”.

Brandão acredita que ser ativista é natural para ele. “Algumas pessoas nascem para isso”, diz. “Ser ativista é estar inquieto e não aceitar injustiças e violações de direitos. Acho que nasci com esse presente porque sempre conduzi processos, mesmo sem saber que era ativismo. E sempre me preocupei em ajudar e capacitar os outros”.

Depois de participar de três, das quatro reuniões de alto nível das Nações Unidas sobre AIDS e da reunião de alto nível de 2018 sobre tuberculose, Brandão sabe como é difícil manter diálogos com outros colegas da sociedade civil e representantes de países. Sua língua materna é o português, que não é um idioma oficial das Nações Unidas. “Falar uma língua estrangeira é uma questão importante para nós no Brasil, então precisamos saber pelo menos o espanhol. Muito poucos ativistas sabem inglês fluentemente o suficiente para poder fazer intervenções nesses espaços”.

Em julho de 2019, Brandão estava entre os delegados das organizações não-governamentais no Fórum Político de Alto Nível sobre Desenvolvimento Sustentável em Nova York, nos Estados Unidos, representando a RNP+ (Rede de Pessoas Vivendo com HIV e AIDS) e sua própria organização não-governamental, a Gestos – Soropositividade, Comunicação e Gênero.

“É essencial que a sociedade civil participe efetivamente dos processos nacionais de implementação e monitoramento da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Não podemos alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável sem a participação total da sociedade civil”, afirma. “Defender a agenda da Aids também requer discutir outras questões igualmente importantes e transversais”.

Por seu papel como assessor de projetos na Gestos e como membro da RNP+, Brandão também lidera o projeto Índice de Estigma de Pessoas Vivendo com HIV 2.0 no Brasil. Com seus colegas da Gestos e outras redes nacionais de pessoas vivendo com HIV, e com o apoio do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento e o UNAIDS, ele ajudou a treinar 30 pessoas em técnicas de entrevistas em sete cidades brasileiras. Em dois meses, coletaram informações sobre estigma e discriminação relacionados ao HIV, realizando cerca de 1.800 entrevistas. Os resultados iniciais serão divulgados antes do final de novembro.

“Esse processo fortaleceu os ativistas que conduziram as entrevistas porque podiam ouvir e entender as histórias pelas quais muitas pessoas passaram e que até agora não podiam compartilhar com ninguém”, lembra ele. “Estamos na quarta década da epidemia de AIDS e ainda há muito estigma e discriminação. O Stigma Index 2.0 é um instrumento que nos dá evidências disso no Brasil. Poderemos advogar políticas e serviços de HIV sem discriminação e sem estigma”.

Brandão diz que acredita no poder da colaboração e da parceria para alcançar o progresso social. “A solidariedade e o espírito da comunidade que ajudaram a criar o movimento da Aids devem voltar em nossas ações e corações”, diz ele. “Repensar estratégias e criar novas maneiras de trazer mudanças é fundamental. Capacitar novos ativistas, especialmente os jovens, é fundamental. Os jovens precisam ser acolhidos e incentivados a receber informações de ativistas experientes da Aids. É hora de unir forças e não de dividir”.

* Tradução de reportagem publicada originalmente em inglês no site do UNAIDS

** Foto: Reprodução do site do UNAIDS