Novo Relatório do UNAIDS indica velho caminho para superar a AIDS
Nesta terça-feira (29), o Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS (UNAIDS) divulgou seu relatório anual, intitulado Desigualdades Perigosas, que reúne os dados referentes aos índices mundiais de HIV/AIDS. O avanço dos números de infecções e óbitos apenas aprofundam uma crise invisibilizada cujos contornos estavam sendo traçados diante de nossos olhos.
Em julho deste ano, o UNAIDS já havia divulgado o relatório In Danger (Em Perigo, em tradução livre), que àquela altura já alertava para o crescimento preocupante dos índices de infecção pelo vírus HIV, aumento no número de mortes em decorrência da AIDS e brutais iniquidades no acesso ao tratamento com antirretrovirais (ART), sobretudo nas regiões mais pobres do globo. De fato, não houveram mudanças significativas nos meses seguintes.
Contudo, este novo relatório já não deixa dúvidas sobre uma questão fundamental para a qual temos alertado há muito tempo: as desigualdades são a principal causa para a perpetuação de uma epidemia que já dura 40 anos. O documento aponta como líderes mundiais podem lidar com essas desigualdades e apela para que orientem as políticas de enfrentamento à AIDS com base em evidências.
Ainda assim, é interessante observar a resistência dos setores políticos e econômicos em ouvir o que têm a dizer a sociedade civil, que há anos vem chamando atenção para a necessidade urgente de se estabelecer mecanismos e políticas de combate às desigualdades estruturais que mantém a epidemia de AIDS até os dias de hoje.
Há anos que a Gestos tem buscado dialogar com tomadores/as de decisão e com a comunidade internacional, defendendo a necessidade de democratização da economia, através da taxação sobre transações financeiras e sobre produtos danosos à saúde, da tributação progressiva sobre grandes fortunas e da criação de mecanismos de financiamento para o desenvolvimento sustentável (em alinhamento com a Agenda 2030) – possibilitando, assim, a criação de um espaço fiscal para investimentos em saúde nos países de baixa e média renda, que foram historicamente expropriados de suas riquezas e hoje estão com seus orçamentos profundamente comprometidos por dívidas substanciais e sem capacidade de investimento em áreas estratégicas.
Fazem décadas que a sociedade civil têm indicado alternativas para ações lideradas pelas comunidades e apresentado evidências que apontam para resultados extremamente proveitosos. Denunciamos, há muito tempo, como as desigualdades estruturais – de raça, classe e gênero – contribuem negativamente para o agravamento desta crise e impossibilitam a superação da AIDS. A verdade é que o aumento dos índices de infecção pelo HIV e de óbitos em decorrência da AIDS vem a reboque de uma escolha política muito perigosa para a sobrevivência humana: a manutenção das desigualdades e a concentração de poder e recursos.
Se há algo que o relatório Desigualdades Perigosas confirma é que, mais do que uma abordagem biomédica, a superação da AIDS passa fundamentalmente pelo combate sistemático às desigualdades e para isso, é necessário coragem e, acima de tudo, compromisso político. Não temos mais tempo a perder.